quarta-feira, 3 de agosto de 2011

SAUDADES OU SÓ LEMBRANÇAS … DO ALGUEIRÃO ( II ) Conclusão

Depois, coube-me explorar a outra parte do meu Mundo, a parte de Baixo, Algueirão Novo!
A ligar as duas partes, a de Cima com a de Baixo, havia uma estrada (ainda hoje Estrada do Algueirão), poeirenta, que hoje, ruas com casas dum lado e doutro, é difícil a quem a não conheceu, saber onde passava. Como alternativa, havia um atalho (hoje o que, praticamente, é a rua dos Morés) pelo meio dos campos, onde, entre campos de cultivo, havia uma Fábrica da Telha.
A estrada, propriamente dita, começaria por alturas do que são, hoje, a Escola Primária e a Igreja, descia ligeiramente e depois de uma subida um pouco mais acentuada, curvava, onde hoje é a rua do Mercado, um pouco abaixo donde foi construído o reservatório de abastecimento de água (que ainda não havia, dado que a água que se utilizava era de poços ou fontes) para a esquerda e para baixo, descia de novo até encontrar a entrada inferior do atalho, numa zona baixa onde estava e ainda está uma mercearia e taberna que não recordo o nome (talvez, “A Competidora”) mas que era do “Pérlita”. Neste local, de passagem duma vala, houve certa vez uma grande inundação que impossibilitou a comunicação dos dois lados da povoação. Ainda pior, porque era por aqui o acesso de e para a estação dos caminhos de ferro!
Com o meu novo Mundo situado cá em Baixo, continuei a minha exploração. As casas aqui, eram mais novas e em maior número mas o movimento de pessoas nem por isso. Muitas das casas eram de veraneio (com o consequente abandono durante o resto do ano) e noutras, as pessoas não trabalhavam no Algueirão, saiam de manhã e retornavam já de noite. A proximidade da estação de caminhos de ferro, ajudava a isso.
É, então, que o centro do Mundo passa para o que se chamaria Rua M (ou seria N?) e hoje é a Rua de Santo Estêvão!
E, é daqui que eu parto para a descoberta do resto do Mundo. Não me alargava muito, pois normalmente só ia até à linha do comboio.

Para lá da linha, ia à drogaria, à farmácia, ao cinema “Chaby”, acabado de construir e uma ou duas vezes, a uma drogaria, o “Africano”, para comprar lixívia (que os tempos eram de crise e não a havia em qualquer lado), ali para os lados dos Casais de Mem Martins.
Pois bem, saindo da tal rua M (ou N), chegava à estrada e, para baixo lá encontrava, do lado esquerdo os “Correios”, depois, à direita o “Pérlita", mais à frente, à esquerda a “Cabeleireira”, numa vivenda, lá para dentro e, já quase junto à linha, do lado esquerdo uma taberna, a “Cova Funda”, e na esquina defronte, uma mercearia. Do lado direito, entre outros havia uma capelista e outra mercearia, e mais acima o talho do Alberto Conde, pai do cavaleiro tauromáquico Manuel Conde (*). Este, tinha casado com a filha do Crispim, do Algueirão de Cima; e dizia-se que a família Conde, seriam os mais ricos de Maçãs de D. Maria! Dinheiro atrai dinheiro!
Ainda junto à linha e no sentido de Sintra, começava a Avenida Capitão Américo dos Santos que, penso ligava à avenida, chamada da “Torrejana”, porque lá no fim ficava uma loja (mercearia) com esse nome. Penso que hoje, essa avenida é a avenida Val do Milho.
Atravessada a linha, do lado esquerdo, ia-se até à Ribeira de Fanares, onde muitas vezes fui com minha mãe, para lavar roupa. Hoje será mais uma ribeira enterrada, talvez sob a Av. dos Capitães de Abril.
Em frente, além da drogaria do “Poças”, da farmácia “Químia” e duma mercearia, a que eu achava muita graça por dizer que era um Armazém de Víveres, coisa estranha para mim, e que ficava defronte da que foi Av. Chaby Pinheiro (penso eu), havia então nessa tal avenida, que pouco mais era do que um descampado, o Cinema “Chaby”. Foi neste cinema que eu vi o “Fado”, "Não há rapazes maus", “Duelo ao Sol”, “A Loura Incendiária”, “Sangue Ardente”, “Tão perto do meu coração”, e “Tarzan e a Fonte Mágica”, o primeiro filme do Tarzan interpretado pelo Lex Barker.
Não foram muitos os filmes que vi mas eu devorava os cartazes que apareciam na montra do “Pérlita”.
E, do lado de lá da linha, em Mem Martins, para mim, era tudo.
Do lado de cá, defronte da minha rua havia o que hoje é a rua do Forno e que era um caminho, até ao atalho. O forno era um forno de cal, local onde era frequente haver acampamento cigano, o que me obrigava, ao passar por ali, no meu caminho para a escola, a fazer uma espécie de “sprint” relâmpago, de modo a ver-me livre de sensações e medos estranhos demais para um miúdo.
Em sentido inverso, a zona de vivendas ali à volta, incluía uma padaria e um terreno mesmo a pedir que se fizessem ali uns “joguinhos” de futebol, que eu aproveitava na companhia de alguns veraneantes. Depois havia um regato, seco no Verão, uma zona de mato, e chegava à “Torrejana”, zona de mais algumas vivendas que se iam distribuindo na avenida, até à linha do comboio. Pouco mais havia, naquele mato imenso que ficava ali defronte de Ouressa mas, mesmo assim, lá no meio, o Colégio D. Afonso V, isolado, parecia não se importar muito com isso. O certo é que anos mais tarde, mudou-se para os lados de Fanares.
Por aqui, nada mais havia. De referir que para lá do atalho, na direcção das Mercês, havia o “Pinhal da Formiga”, onde corria uma ribeira que julgo seria a Ribeira de Fanares e onde apanhava lírios nas suas margens. Hoje, são ruas e prédios!
Assisti, à construção do edifício da Estação de Caminho de Ferro, pois até ali, o Algueirão, era apenas um apeadeiro; à viagem inaugural das primeiras carruagens, suíças, viagem feita pelo senhor Presidente do Conselho, dr. Oliveira Salazar e à viagem da rainha D. Amélia, a Sintra.
E, dos 3 aos 9 anos, foi este o meu Mundo, conhecido a palmo e que hoje me recuso a reconhecer mas que não esqueço!
A freguesia mais populosa do país, parece nunca ter tido passado. E futuro, terá?

(A foto do cinema "Chaby", foi retirada do blogue www.algueirao-memmartins.blogspot.com e penso que seja dos anos 70 pois vê-se, nela, o que me parece ser um Fiat 127)

(*)Alertado por leitor atento e porventura mais conhecedor do que eu, aqui fico a correcção do que eu, por lapso de memória ou outro, escrevi no "post" original e que foi : "e mais acima o talho do Alfredo Conde, cavaleiro tauromáquico, pai do também cavaleiro Manuel Conde", o que está manifestamente errado pois que Alfredo Conde era o seu irmão e que eu, até agora, desconhecia que também tivesse sido cavaleiro tauromáquico. Vivendo e aprendendo!
Aqui fico também o meu agradecimento ao leitor Serafim Coito.

4 comentários:

  1. Boa noite... gostei deste texto, será que me autoriza a utilza-lo no "Blog Algueirão Mem Martins" http://algueirao-memmartins.blogspot.pt/

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    1. Muito boa noite!
      Se gostou deste texto, o meu gosto por saber isso não foi menor.
      Claro que lhe dou permissão para o que me pede e tal qual eu fiz com a imagem que aí fui buscar, apenas peço que refira a origem do texto pois como lhe digo atrás o gosto é meu. O Algueirão é quase como se fosse a minha terra natal e não o esqueço nem os amigos que aí fiz. Amigos de infância que ficam para sempre, nem que seja apenas na nossa memória.

      Melhores cumprimentos,
      João Celorico

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  2. Boa tarde. O meu nome é Serafim Nunes Coito, email- nunescoito@hotmail.com.
    Tenho 79 anos e embora não tenha nascido em Mem Martins vivo cá pelo menos há 76 anos.
    Li o seu texto através do blog de Mem Martins e gostei muito, parabéns. Gostaria muito de poder trocar algumas impressões consigo a cerca deste assunto, pois existe uma confusão com a família Conde.
    Cumprimentos.

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    1. Boa noite!

      Foi um grato prazer receber o seu comentário. Eu também não nasci no Algueirão mas, como para aí fui ainda com 3 anos, é quase a minha terra e dela guardo gratas recordações dos cerca de 6 anos que lá vivi.
      Se eu puder ser útil, faça o favor de me dizer o que pretende saber e eu procurarei responder. A propósito e porque, como sabe, fui contactado pelo administrador do blogue de Algueirão-Mem Martins, estou a pensar propor deslocar-me ao Algueirão e reviver na actualidade os locais da minha infância.
      Felizmente parece-me ter uma boa memória, portanto, como digo acima, faça o favor de colocar a sua questão!

      Melhores cumprimentos

      João Celorico

      PS: Suponho que a sua questão seja acerca do facto de eu ter referido Alfredo Conde como o pai de Manuel Conde, quando eu quereria dizer Alberto Conde. Alfredo é o irmão, de quem naquela altura ainda pouco se falava. Na minha memória de miúdo o mais conhecido era o Manuel Conde!









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